segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Manual da perda de autoconfiança 2

O mendigo é um personagem extraordinário ,  claro exemplo do que queremos dizer por vontade de viver.
O mendigo não tem necessariamente a ver com desapego ou santidade, algo que só entendemos de forma mítica e raramente podemos praticar. Pois desapego e santidade  raramente sãop completamente voluntários, mas a culminância de situações que terminaram por nos absorver e transformar.
Sería, portanto, ilegítimo apormos ao mendigo símbolos adventícios d piedade. Ao contrário vários consistentemente assumem sua posição de escândalo e se recusam a aceitar qualquer consolo, em se deixar envolver por qualquer dialética, em se iludir por qualquer ostentação exterior de bondade e compaixão.
Sua posição de completa destituição lhes fornece uma grande lucidez sobre nossas motivações mais profundas e o que jaz latente em nosso discursos comovidos e nossas ações bem comportadas a eles direcionadas. Como mendigos eles sabem que estão à margem de qualquer convivência e o quanto nosso pífios atos caridosos escondem nossas inconsistências, medos e ansiedades.
Ao doarmos  aquém não pode retribuir , sentimo-nos superiores e protegidos contra o estado de necessidade absoluta em que eles esse encontram. E se não resistimos nos aproximar deles de forma carola e piegas , estejamos preparados para o desprezo e manipulação da parte deles.
Nem símbolos de desapego , nem mártires da piedade, os mendigos nos ensinam algo mais radical e essencial. Eles e seus vira-latas são os símbolos mais acabados da vontade de viver.
Esta vontade que depois de todas as depressões, humilhações e destituições, ainda os levam a a engolir com vontade qualquer coisa que possam achar para matar a fome, levantarem-se de manhã de pois de uma noite de frio, nudez , ou mesmo estupro, caminharam depois de uma overdose ou diarreia, ranger os dentes e continuar vivendo.
Pois depois disto tudo e muito mais, eles continuam desejando ser, independente de valores ou critérios de decência, sucesso ou fracasso. A vida para eles adquire valor por si mesma, pois se torna a possibilidade da continuidade de uma identidade  e nada mais.
A aceitação desta premissa dá a estes senhores  e senhoras  recursos extraordinários, pois tudo  exige deles decisões com bases em probabilidades fora de nossas expectativas. Estar atento e à altura deste desafio é o que os mantém vivos.

Oxalá estivéssemos mais atentos a este fato básico , ao qual penduramos tantas considerações secundárias . Estamos vivos, ainda que dormindo. 

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