terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O romance de Tristão

A literatura e a crítica musical pintam o romance de Tristão e Isolda como o protótipo da entrega e do êxtase amoroso. Tristão e Isolda simbolizam um amor tão completo e intenso que somente a morte os poderia levar à completude que procuravam. . O amor seria um sentimento poderoso que extravasaria a  própria vida e encontraria na  auto dissolução e na morte  a plenitude almejada. Logicamente esta mensagem era um repto bastante claro ao sólido amor burguês, familiar e cristão( embora Cristo tenha desejado a morte por amor). 
O que não se comenta tanto é que Tristão e Isolda se entregam a um amor culpado. Tristão, ao apaixonar-se por Isolda trai seu rei e amigo.Isolda por sua vez , sente-se traída por Tristão ao ser por ele entregue ao Rei Marke. O ressentimento de ambos é "curado" pela poção de Brangaene, permitindo aos amantes declarar sua paixão.Mas esta paixão não é forte o suficiente para que eles possam se libertar do contexto que os limita. Somente  a noite consegue dirimir as barreiras que separam os dois amantes, o herói culpado e a amada traída.
Como ambos absorvem a culpa que envolve o seu amor, tornam-se bodes expiatórios dos inimigos de corte e Tristão termina ferido mortalmente. Sua relação com Marke é filial e edipiana, tal como Don Carlo com Felipe II. E ambos os reis se tornam os carrascos de seus filhos . Em ambos os romances, o de Don Carlo com Elisabeta e o de Tristão com Isolda, o elemento do incesto está implícito na traição à figura paterna. 
Em ambos os casos os heróis têm inimigos terríveis e amigos leais. Em ambas as histórias, eles não conseguem romper os limites que os sufocam. Na verdade, Tristão não morre por amor,  mas por culpa. E Isolda se "suicida ", em protesto por sua perda. Enleio e dor se entrelaçam neste amor tisnado desde sua origem. 
Wagner consegue traduzir o peso destas emoções em grande construtos musicais. Confira a poderosa metáfora do desejo em um prelúdio que não se resolve, o conflito como marke na descoberta do casal enamorado, a depressão e isolamento retratados no prelúdio do terceiro ato. A ambiguidade da música retrata os anseios e medos dos personagens que se entregam a uma relação, que m última instância não consegue libertá-los da culpa e do desespero. 

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